quinta-feira, 3 de setembro de 2009

OS MERCADORES DA IGREJA

“Curai os enfermos, ressuscitai os mortos, limpai os leprosos, expulsai os demônios; de graça recebestes, de graça daí” (Mateus 10:8)

"Porque nós não estamos como tantos outros, mercadejando a palavra de Deus...”(2Co 2:17)

Qual seria a reação de Jesus se, hoje, ele adentrasse num desses shoppings gospel ou assistisse a um programa de TV evangélico? Ele se depararia com uma avalanche de ofertas de pulseiras, CDs, DVDs, bonecos, bolsas, bonés, adesivos, sandálias, roupas, anéis, botons, água do rio Jordão, óleo de Israel, miniaturas da arca da aliança, etc., com o seu “nome” escrito; todos com a intenção de serem consumidos pelos cristãos. Um mercado autônomo, gigantesco, em nome da fé. A cena se assemelharia a dos “mercadores do templo” de sua época, com uma roupagem moderna e tecnológica é claro, mas com a mesma intencionalidade. Além dos produtos, arrecada-se em eventos, congressos, conferências, caravanas com peregrinações à Terra Santa, edição e venda de livros e revistas, etc., a criatividade não tem fim.

Um dia desses, diante de uma banca de revistas, li uma chamada de capa num folhetim, sobre como ganhar dinheiro no filão gospel. Folheei rapidamente a dita reportagem que ensinava a fazer miçangas, pulseiras, anéis, camisas e brincos com a temática evangélica e com certeza de lucro rápido. Vejam, que até a mídia secular já percebeu o disparate. Sem contar que o material evangélico – em especial livros, CDs e DVDs – são mais caros do que os seculares. Não é à toa que cada denominação ou "ministério" tem sua própria editora, livraria, gravadora e distribuidora dos seus “produtos”.

A verdade é que, neste quesito, estamos como nos dias de Jesus com a vulgaridade dos sacrifícios e ofertas no templo e, ao mesmo tempo, na idade Média com a chamada venda de relíquias e indulgências, a qual consistia em oferecer ao fiel piedoso uma lasca da cruz de Cristo, um pedaço de um vestido dos discípulos, ossos de santos e por aí vai. O propósito é o mesmo. Na palestina do século I, o templo tinha virado comercio; na idade média, durante o Pontificado do Papa Leão X, o dominicano Johan Tetzel vendia o perdão dos pecados para construir a basílica de São Pedro; hoje, a arrecadação serve para o enriquecimento e manutenção da saúde financeira de um pequeno grupo de “empreendedores” evangélicos que vivem viajando para a Europa, comprando propriedades lá fora e, como eles mesmos dizem, "comendo o melhor da terra".

A desculpa para a venda e exploração de produtos no mercado é de que não há subsídios de lugar algum para fomentar a igreja. Mas o que vemos é que existe uma grande margem de lucro nos produtos que visa o enriquecimento e não a edificação da igreja. Por exemplo, a Bíblia deveria ser o livro mais barato: a palavra de Deus ao alcance de todos, no entanto, poucos podem comprar certas Bíblias que são postas à venda.
Falando em Bíblia, ela está sendo usada para as mais variadas arrecadações: da culinária à medicina, encontramos Bíblias recheadas de dicas para o dia-a-dia ou de como administrar as finanças pessoais ou empresariais. Aliás, cada vez mais nas chamadas Bíblias de Estudo estreita-se o espaço do TEXTO bíblico. Povoa-se a página de notas, comentários, estudos concisos e mapas, de maneira que fica muito difícil se concentrar na leitura do texto propriamente, sob pena de, a todo momento, a atenção estar voltada para as famigeradas notas explicativas. Em tempo, há excelentes Bíblias de estudo que, numa proporção razoável se utiliza de auxílios ao leitor.

Outra coisa: nenhum outro aspecto do fenômeno cristão mostra a descarada apropriação indevida e a má utilização da fé e do nome de Jesus como neste “mercado” evangélico. São verdadeiros mercadores da igreja, tornando-se milionários sem precisar pagar "direito autoral", pois, livros e músicas antigas são reeditados e lançados numa nova roupagem sem que se precise pagar nada a ninguém. É lucro bruto. Nossos televangelistas(?), a exemplos dos norte-americanos, são excelentes marqueteiros e arrecadadores de vultuosas somas de dinheiro. Com o pretexto de ajudá-los a “pregar” o evangelho, intimam os telespectadores a se tornarem “parceiros”, “associados”, “semeadores”, “sócios”, etc. Mas, o ouvinte fiel realmente não sabe em que, verdadeiramente, foi empregado tantas somas, visto que não há prestação de contas e nem publicidade de relatórios. Esta é a parte mais negra do problema, ou seja, não há transparencia neste negócio. Nenhum destes que arrecadam, tem o brio de expor sua contabilidade – o que seria o mínimo justo – para que seus mantenedores pudessem contribuir com transparência. Assim, é uma pena que o Estado não possa fiscalizar tanto dinheiro. Exemplo oposto, os missionários que não arrecadam tanto, vivendo de minguadas ofertas, enviam mensalmente “relatórios de campo” às igrejas e membros que, na maioria, estão completamente indiferentes à sua situação.

Infelizmente, para muitos que estão nesse ramo do mercado, estão aí, porque viram uma excelente oportunidade de enriquecimento com o produto alheio: o nome de Jesus. Hora, é um filão estonteante: são 30 milhões de consumidores “fidelizados”, com um movimento de mais de R$1 bilhão de reais por ano, segundo matéria publicada encontrada neste link http://noticias.gospelmais.com.br/mercado-gospel-movimenta-r-1-bi-no-pais.html, ou o que a revista IstoÉ Dinheiro(set/2003) publicou constatando que "o mercado de produtos religiosos ignora a crise. Cresce 30% ao ano, move 800 empresas e gera receitas de R$ 3 bilhões". Conforme os dados da própria revista:

- 100 milhões de reais é o valor que a música gospel rende às gravadoras;
- 14% dos CD's vendidos no Brasil são de cantores ou grupos religiosos;
- 139 milhões de reais é quanto faturou o mercado literário cristão;
- 8 milhões de bíblias comercializadas em 2002. O País exporta o livro sagrado para 30 países;

Não precisa muito esforço para mostrar que, para os líderes-empreendedores-evangélicos, não existe lugar melhor no mundo.

Mas esse problema é bem antigo. Demétrio, o ourives também lucrava com os nichos da deusa Diana (Atos 19:24); Pedro teve que repreender severamente Simão, o mágico, que quis comprar o Dom do Espírito Santo, provavelmente para revender(Atos 8:18); Paulo teve de lidar com um grupo que “descobriu” que “a piedade é fonte de lucro” (ITm 6:5) e a Igreja Católica já lucrou e ainda lucra bastante com a fé. Contudo, a questão posta à todos os que se renderam à lógica do capital é: fui curado, porque tenho que vender meu testemunho? Recebi a cura de graça! Deus me iluminou e me deu uma mensagem daquelas; porque tenho que negociá-la? Deus me deu uma voz maravilhosa porque meu cachê é tão caro e os meus CDs e DVDs custam o olho da cara? Não recebi pela Sua graça? Como diz Paulo “e que tens tu que não tenhas recebido?” (1Co 4:7b). Ou alguém pensa que tem algum mérito diante de Deus para cobrar pelos seus serviços?

Por isso, se Jesus nos visitasse por esses tempos, creio que ele sacaria o seu arrozague com a mesma fúria e indignação de antigamente, e o que ele disse naquela ocasião, seria bem apropriado para hoje.

“De graça recebestes, de graça, daí”.

Soli Deo Glori!!!!

7 comentários:

  1. Pr.Nilson,

    Nada como ter uma grande companheira. Acredito que os artigos irão nos levar à reflexão. Terei imenso prazer em lê-los.
    Núbia

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  2. Sou Jucileia..e acho que este artigo está muito bem fundamentado. Compartilho com o autor o sentimento de indignação diante de algumas posturas adotadas atualmente por alguns cristãos. Devemos rever muita coisa e adotar sempre um "cristianismo puro e simples"
    Te amo!!!

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  3. Que delícia de espaço!
    Sobre o artigo? sábias palavras!
    Te encorajo a escrever mais...ficarei ansiosa pelos próximos!
    Abraços pra essa família linda: Ju, Nilson e Julinha.

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  4. Pastor Nilson, aqui é Ana Cecília! Que bom revê-lo, ainda que pela internet! Li seu artigo e concordo plenamente com tudo que foi dito e se me permitires acrescentar algo, não bastasse esse "estelionato gospel" que estamos vendo por aí, ainda presenciamos a falta de compromisso de muitos pastores com suas ovelhas, visto que podemos olhar para as assembléias legislativas e câmaras municipais, encontraremos inúmeros deles, em local e função erradas, quando na verdade deveriam estar a serviço do Reino de Deus! É impressionante também a falta de amor dentro da igreja, pessoas com muito menosprezando pessoas que não tem nada, cristãos idosos sendo desrespeitados, pastores taxando de intolerantes membros que não concordam com tais disparidades, a importancia exageradamente dada a usos e costumes humanos em detrimento da doutrina distorcida. Tenho consciência de que não devo julgar, mas não podemos compactuar com estas transgressões. Fiz recentemente um comentário no facebook a respeito disso: O que Deus quer de nós? Rios de dinheiro? Holocaustos? Fanatismo religioso? Deus, através do profeta
    Miquéias nos da a resposta:"Ele te declarou, ó homem, o que é bom e que é o que O Senhor pede de ti:que pratiques a justiça, e ames a misericórdia, e andes humildemente com O teu Deus".
    Pastor, eu irei colocar um link do seu blog no meu blog!
    Deus o abençoe, um beijo na Léia e na Julinha
    Ana Cecília Cabral Barreto

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  5. seu acréscimeo é bem vindo ana cecília. Nós, pastores não estamos acima da lei, quanto mais da ética de Jesus.

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  6. Muito Bom esse artigo, estarei divulgando no meu blog como o canal do conhecimento. Abracos!!! Elton Rabêlo

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  7. Acrescentando que muita coisa nestes pacotes gospels são lixo e muitas vezes testemunhos mentirosos. As musiquinhas na sua maioria são sofriveis em materia de Escritura.

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